Comentários
Políticos - Wladimir Pomar
É
compreensível a indignação dos militantes e dirigentes do PT
condenados pelo STF na ação penal 470. Como já reiteramos em
outros comentários, o STF atropelou normas e procedimentos
jurídicos. Aceitou a tese do mensalão, sem qualquer consistência
objetiva, pois se houvesse teria que ter julgado a maior parte da
Câmara dos Deputados. Ignorou a confissão do uso de caixa 2.
Transformou o cartão Visa numa propriedade do Banco do Brasil, o que
deveria gerar uma ação de posse por parte do banco estatal, criando
um caso internacional. E agiu como um tribunal de exceção, na
tentativa de criminalizar judicialmente a política.
Nesse
sentido, os militantes e dirigentes condenados têm todo o direito de
protestar, apelar para a solidariedade pública, ingressar com
apelações judiciais contra as decisões do STF, e desmascarar os
desmandos praticados durante a ação penal. No entanto, eles cometem
um erro crasso ao pretenderem estabelecer uma relação de tais ações
de repúdio aos procedimentos e às decisões do STF com o apoio e
sustentação do governo da presidente Dilma, e com a luta pelas
reformas politica e tributária. E praticam um erro maior ainda ao
pretenderem fazer com que o PT assuma, neste momento, como sua tarefa
mais importante, a luta pela anulação das condenações.
Esquecem
que isto incluiria absolver também o escroque que praticou inúmeros
delitos comprováveis e colocar o PT no banco dos réus. Parecem não
perceber que isto é o mesmo que mobilizar o PT para uma armadilha
que o próprio STF tentou armar durante o processo 470 e não
conseguiu. É evidente que o julgamento, desde o início, foi
político. Tinha por objetivo inviabilizar o governo e criminalizar
as atividade do PT. E só não obteve sucesso porque o PT considerou,
também desde o início, que aquela ação penal envolvia, e deveria
envolver apenas indivíduos que eventualmente eram filiados do
partido. Este, como um todo, não tinha e não tem responsabilidade
pelas ações que alguns de seus membros e dirigentes praticaram à
sua revelia.
Se
o partido houvesse sido consultado a respeito de angariar finanças
de campanha eleitoral através de um conhecido escroque, ligado ao
governo tucano de Minas Gerais, certamente o partido teria rejeitado
tal ação. Porém, mesmo tendo consciência desse repúdio coletivo,
alguns dirigentes e militantes petistas decidiram, por sua conta e
risco, realizar essa aliança espúria. Aliança que se tornou ainda
mais arriscada à medida que envolveu conhecidos dirigentes corruptos
e corruptores de outros partidos, abrindo flancos para o mais
perigoso e danoso ataque da direita, não só ao PT, mas também ao
governo Lula.
Pouco
importa que tal ataque tenha sido hipócrita, já que a direita
pratica o caixa 2 e a compra de votos desde sempre. O resultado
concreto é que tal ataque quase transformou o caso numa crise
constitucional e partidária. Apesar disso, os filiados que cometeram
tal erro e levaram o PT e o governo Lula a passarem por uma crise que
não haviam promovido, sequer reconhecem a gravidade de seu erro.
Foram alertados, de diferentes formas, inclusive através de artigos
públicos, da necessidade de reconhecerem tais erros, inclusive como
forma de defenderem o partido e a si próprios contra as ações da
direita. No entanto, perseveraram no caminho do silêncio quanto aos
erros cometidos.
O
resultado dessa aliança com o escroque Marcos Valério, e da recusa
em tornar público o reconhecimento do erro, foi bem aproveitado pela
direita. Numa operação bem articulada, o STF assumiu uma ação
penal que não lhe competia, a não ser em parte, e transformou o
julgamento num circo midiático de criminalização judicial da
política. Como um erro puxa outros, os réus entregaram sua defesa
totalmente aos argumentos jurídicos, ao invés de transformarem o
julgamento numa disputa política, como agora reconhecem que ele foi.
Tinham a ilusão de que o STF ficaria amarrado às normas e aos
procedimentos jurídicos comuns e que, sem provas materiais, seriam
absolvidos. Ou seja, da mesma forma que erraram ao aceitar negócios
escusos com um escroque ligado ao tucanato mineiro, erraram ao se
subjugarem à defesa estritamente jurídica de um julgamento de
natureza política, onde as provas são imateriais.
Agora,
na mesma linha de sucessão de erros, querem que o PT transforme sua
defesa na principal tarefa partidária, sem sequer se darem conta de
que, com isso, empurram o partido para uma armadilha. A maioria do
STF pretende condenar todo o PT como cúmplice das ações e erros
cometidos pelos filiados condenados. Em vista disso, não deixará de
aproveitar qualquer oportunidade que se apresente. Basta ver como
foram céleres em aceitar o novo depoimento do escroque mineiro
incriminando Lula. Assim, se o diretório nacional do PT aceitar a
proposta de defesa pública desses filiados, ainda por cima incluindo
a defesa do escroque contra o qual há provas contundentes, estará
dando ao STF os motivos para colocar em andamento sua máquina de
criminalização judicial da política.
Os
filiados atingidos pela ação penal 470 não podem transformar sua
situação numa síndrome partidária. Têm o direito de se defender
e de mobilizar os que comungam de seu inconformismo. Mas precisam ter
consciência de que tal mobilização tende a desviar o PT e o
governo das questões políticas essenciais. Para escapar da
armadilha que procuram lhe impor, tanto a direita, conscientemente,
quanto os solidários aos condenados, inconscientemente, o PT
precisará focar ainda com maior decisão a luta contra a
desigualdade social, o domínio da economia pelo capital estrangeiro,
e os entraves que impedem maior participação democrática na
política e no governo.
O
PT, assim como toda a esquerda do país, precisa se concentrar nas
lutas pela industrialização soberana, pela reforma política, neste
caso especialmente para proibir o financiamento privado das campanhas
eleitorais, pela reforma tributária, e pelo fim do monopólio
privado das comunicações. É no bojo desse processo, especialmente
da reforma política, que o STF pode ser obrigado a rever o
julgamento da ação penal 470, tendo como base a legislação que
atropelou de forma tão descarada.
Os
filiados enredados nas armadilhas da direita devem aprender com as
lições que lhe foram impostas por seus próprios erros. Devem
assumi-los modestamente, e evitar que a síndrome do 470 paralise o
PT. Só isso pode criar as condições para salvá-los e esclarecer
como a justiça burguesa é capaz de atropelar suas próprias leis
para condenar seus inimigos. Se não se imbuírem dessa modéstia e
da paciência que deve caracterizar os combatentes pela verdade,
certamente criarão mais confusão do que esclarecimento, abrindo
flancos para novos ataques da direita.
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