NOTA
DE REPÚDIO
Redução
da maioridade penal: um retrocesso calcado em mentiras
A Associação
Brasileira de Organizações Não Governamentais - Abong vem a público repudiar a
decisão da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos
Deputados que aprovou, na última terça-feira (31/03), a tramitação da Proposta
de Emenda Constitucional (PEC) 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para
16 anos. Apesar dos protestos de manifestantes presentes à reunião, com 42 votos
a favor e 17 contra, a CCJ considerou a PEC admissível em termos de
constitucionalidade, legalidade e técnica legislativa.
A sociedade
brasileira, por meio de importantes e representativas instituições, tem
manifestado completa discordância e repulsa à possibilidade de alteração da lei.
Estas entidades estão se mobilizando para que não haja retrocesso em conquistas
fundamentais dos/as jovens no Brasil, viabilizadas por meio do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), que em 2015 completa 25 anos e é considerada uma
legislação de referência mundial. A Abong vem se somar a essas inúmeras vozes da
sociedade civil brasileira contra aquilo que considera um marco no retrocesso de
direitos e uma violação à história de luta por direitos humanos no
País.
Toda a argumentação
em defesa da redução da maioridade penal parte de premissas falsas. Uma delas, a
de que o aumento de penas de prisão diminui a criminalidade. Experiências
internacionais mostram que essa relação não existe. Países que optaram pela
redução da idade penal no passado como Alemanha, Espanha e Japão retrocederam
nesta decisão ao analisarem a reincidência criminal de jovens ao saírem da
prisão, além do abarrotamento de seus sistemas
carcerários.
Outra ideia
equivocada é tratar os/as adolescentes como os/as principais responsáveis pelo
alto número de mortes violentas que ocorrem todos os anos em nosso país. Segundo
dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), dos atentados contra
a vida no Brasil, menos de 1% são cometidos por adolescentes, o que representa
0,013% dos/as 21 milhões de adolescentes brasileiros/as.
Ao contrário, os/as
adolescentes são as maiores vítimas da violência no Brasil: mais de 33 mil
adolescentes foram assassinados entre 2006 e 2012, também segundo dados do
Unicef. Esse número coloca o Brasil como o segundo país do mundo que mais
assassina adolescentes, atrás apenas da Nigéria. Os homicídios são, hoje, a
principal causa da mortalidade de jovens entre 15 e 24 anos no Brasil e atingem,
em especial, negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas
metropolitanas, segundo o Mapa da Violência de 2014. Justamente a parcela da
população que será atingida com a aprovação da PEC 21.
A alegação de
combate à impunidade também não corresponde à realidade. Hoje, adolescentes
infratores/as a partir dos 12 anos cumprem medidas socioeducativas em unidades
específicas de internação, que têm como objetivo evitar que estes/as reincidam,
tendo sucesso em mais de 80% dos casos. Com a redução, muitos desses/as
adolescentes seriam incluídos em um sistema carcerário já muito além de sua
capacidade, que exibe taxas de reincidência acima de 70%. Entendemos como um
enorme contrassenso a decisão de mandar para um sistema falido adolescentes que
a sociedade quer supostamente recuperar.
Além de ineficaz, a
medida é, no entendimento da Abong, inconstitucional, comprometendo direitos e
garantias individuais previstos na Constituição de 1988. Além disso, também iria
contra recomendação da Organização das Nações Unidas (ONU) que determina que as
crianças de todo o mundo devem ser protegidas por mecanismos especiais de
alimentação, saúde, educação, moradia e, inclusive, tratamento especial quando
violam a lei. Outros órgãos internacionais, como a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), também
expressaram publicamente sua preocupação com o tema.
No próximo período,
a Câmara criará uma comissão especial para examinar o conteúdo da PEC durante 40
sessões, juntamente com 46 emendas apresentadas nos últimos 22 anos, desde que a
proposta original passou a tramitar na Casa. Depois, o texto segue para plenária
onde precisa ser aprovado em duas votações por três quintos dos/as deputados/as
antes de seguir para o Senado.
Esperamos que os/as
parlamentares da Câmara e do Senado não permitam que este retrocesso se
concretize, o que seria uma derrota sem igual para a democracia
brasileira.
Abong
– Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns
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